Série Regularização Imobiliária #1: Você é dono ou apenas morador do seu imóvel? Descubra se seu imóvel é realmente seu.
- Samuel Martini Casagrande
- 27 de nov.
- 6 min de leitura

Introdução
Você já parou para pensar se o seu imóvel está seguro? Se o imóvel é realmente seu?
Talvez você more nele há anos, pague todas as contas em dia, mas a escritura nunca foi passada para o seu nome. Ou quem sabe você adquiriu aquela oportunidade imperdível com um "contrato de gaveta" e nunca conseguiu oficializar a transferência? Há ainda o caso clássico: herdou um bem de família que nunca foi devidamente registrado no inventário.
Se você se identificou com alguma dessas situações, saiba que não está sozinho.
Milhões de brasileiros vivem essa realidade, ignorando uma "crise invisível" que se esconde na papelada: a irregularidade imobiliária. Embora seja uma situação comum no Brasil, ela é preocupante.
Um imóvel sem a documentação correta e sem o registro no Cartório de Imóveis é uma pedra no sapato que pode custar caro. Desde a impossibilidade de vendê-lo por um preço justo até complicações graves na hora da partilha de bens, a irregularidade não é apenas uma "burocracia chata" — é uma falha na própria titularidade do seu bem.
Ciente dessa realidade, preparei esta série de artigos para descomplicar a regularização de imóveis. O objetivo é desmistificar a papelada e te mostrar, de forma clara, como garantir que o seu patrimônio esteja 100% seguro.
Nota: Nesta série específica, focaremos na regularização imobiliária cível (usucapião, adjudicação, retificação, etc.), deixando o tema da REURB (Regularização Fundiária Urbana) para uma próxima oportunidade. |
Vamos ao que interessa!
Afinal, o que é um imóvel irregular?
Imóveis irregulares são um problema silencioso. De forma simples, é quando a realidade de fato (você morando na casa) não bate com a realidade jurídica (o que está no papel).
No Brasil, uma parcela gigantesca da população vive em imóveis que não estão formalmente em seu nome. As causas mais comuns são:
Contrato de Gaveta: A compra foi feita apenas com contrato particular, sem escritura pública.
Transferência Incompleta: O antigo dono nunca passou a escritura definitiva para o atual comprador.
Herança Travada: Imóveis de falecidos que nunca passaram por inventário.
Construções "Fantasmas": Você ampliou a casa, fez uma piscina ou uma reforma que mudou a metragem, mas nunca avisou a Prefeitura ou o Cartório (a obra não foi averbada).
Se você possui um imóvel há anos, mas a matrícula dele no Cartório de Registro de Imóveis ainda está no nome do vendedor (ou do parente falecido), seu imóvel está irregular.
As consequências: Por que você não deve ignorar a regularização do imóvel
Regularizar pode parecer algo que "dá para deixar para depois". Contudo, o maior perigo de um imóvel irregular é que, legalmente, ele não é seu — ou parte dele não existe para o mundo jurídico.
Isso gera consequências diretas e financeiras:
Desvalorização de Mercado: Ninguém quer comprar um problema. Sem registro, o imóvel sofre uma desvalorização que pode chegar a 30% ou mais, além de afastar compradores sérios.
Impossibilidade de Financiamento: Bancos só liberam crédito imobiliário ou aceitam o imóvel como garantia se ele estiver 100% regularizado (com matrícula em dia).
Risco de Perda do Bem: Se o imóvel ainda está no nome do antigo dono, e esse antigo dono tiver dívidas trabalhistas ou fiscais, o imóvel (que você comprou e pagou) pode ser penhorado para pagar a dívida dele. Sim, o risco é real.
Conflitos Familiares: Construções não formalizadas ou doações de boca geram imensos desgastes e brigas entre herdeiros no futuro.
Vale lembrar que isso também se aplica aos imóveis rurais. Terras com áreas excedentes não registradas ou delimitações incorretas são responsáveis por grande parte dos conflitos no campo.
O perigo do "Só tenho um Contrato de Gaveta"
É muito comum no Brasil a compra de imóveis através do famoso "contrato de gaveta" (oficialmente chamado de Instrumento Particular de Compra e Venda), sem proceder com o registro da compra na matrícula do imóvel.
O problema é que, juridicamente, o contrato de gaveta não transfere a propriedade. Ele apenas diz que o vendedor prometeu vender e você prometeu comprar. Para a lei, o dono do imóvel continua sendo quem está com o nome lá no Cartório de Registro de Imóveis.
Por que isso é um risco?
Imagine o seguinte cenário: você comprou a casa do Seu João há 10 anos, pagou tudo direitinho, mas nunca passou para o seu nome no cartório.
E se o vendedor falecer? O imóvel pode entrar no inventário dele, e os filhos dele podem nem saber (ou não querer reconhecer) que a casa foi vendida para você.
E se o vendedor tiver dívidas? Se o Seu João for processado e dever dinheiro, a justiça pode penhorar a casa que você mora, porque, no papel, ela ainda é dele.
E a má-fé? Infelizmente, acontece: o vendedor pode tentar vender o mesmo imóvel para outra pessoa. Quem registrar primeiro, leva. Pense na dor de cabeça!
O que é, na prática, a Regularização Imobiliária?
Agora que você entende os riscos, fica fácil compreender a solução.
Regularização imobiliária é o conjunto de medidas jurídicas e administrativas para sanar as pendências do imóvel. É o ato de "arrumar a casa" documentalmente. O objetivo é fazer com que a situação real (quem é o dono, qual a área construída, limites do terreno) seja exatamente a mesma que consta na Matrícula do Imóvel.
Portanto, regularizar um imóvel significa alinhar a realidade com o que consta nos documentos oficiais, como:
Corrigir dados da matrícula;
Registrar a escritura de compra e venda;
Averbar construções e reformas;
Formalizar heranças;
Emitir ou atualizar registros antigos.
No fim, é garantir que quem aparece como dono no Cartório seja realmente o dono na prática.
Escritura x Registro: A confusão clássica
Aqui está o "pulo do gato" que confunde muita gente. Ter a Escritura Pública (aquele documento bonito, feito no Tabelionato de Notas) é um passo fundamental, mas ela sozinha ainda não te torna dono.
Pense na Escritura como o contrato formal, oficial. Ela diz: "Ok, a venda aconteceu e está tudo certo". Mas, para o mundo saber que você é o dono, você precisa pegar essa Escritura e levá-la ao Cartório de Registro de Imóveis.
Lá, eles vão anotar essa venda na Matrícula do Imóvel.
A Matrícula é como se fosse o "RG" da casa. Nela consta toda a história:
Histórico dos proprietários;
Descrição e características físicas;
Construções e ampliações;
Gravames (como hipoteca, penhora etc.)
A base legal para isso está no Código Civil e na Lei de Registros Públicos:
O Código Civil (Lei nº 10.406/2002), em seu Artigo 1.245, estabelece: "Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis." A Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973) detalha o processo e garante a fé pública dos documentos.

Se o seu nome não está na Matrícula, você tem a posse (o uso), mas não a propriedade (o domínio)!
Regularização e Herança: Evite um pesadelo para sua família
Este é um ponto delicado, mas necessário. O falecimento de um ente querido já é um momento difícil. Infelizmente, muitas famílias só descobrem as irregularidades ao tentar abrir o inventário.
Quando os bens deixados não estão regularizados, o inventário pode travar. Se o imóvel ainda está no nome do antigo vendedor, por exemplo, os herdeiros não conseguem transferir o bem para si. Será necessário primeiro regularizar a compra antiga (muitas vezes via usucapião ou adjudicação) para só depois finalizar a partilha. Isso transforma um processo que deveria ser simples em uma novela que dura anos e consome recursos da família.
Por que regularizar seu imóvel?
Regularizar não é burocracia: é proteção patrimonial.
Segurança jurídica: Você só é dono quando está registrado no Cartório.
Valorização: Imóveis regularizados podem valer até 30% a mais.
Acesso a crédito: Para financiamento, garantia ou empréstimos, a regularidade é indispensável.
Facilidade na venda: Documentação pendente trava negociações e afastam compradores.
Tranquilidade na sucessão: Evita conflitos, atrasos e gastos no inventário.
"Descobri que meu imóvel está irregular. E agora?"
Calma, não precisa entrar em pânico. A boa notícia é que o nosso sistema jurídico evoluiu muito e hoje existem diversos caminhos para regularizar essa situação, muitos deles sem nem precisar pisar em um tribunal (os chamados procedimentos extrajudiciais, feitos direto no cartório).
Dependendo do seu caso, as soluções podem passar por:
Adjudicação Compulsória: Quando você pagou tudo, tem o contrato, mas o vendedor sumiu ou se recusa a passar a escritura.
Usucapião: Quando você já mora no imóvel há um bom tempo, cuida dele como dono, mas não tem a documentação perfeita. Hoje, a usucapião pode ser feita de forma muito mais rápida diretamente no cartório.
Inventário: Quando a irregularidade vem de uma herança não resolvida.
O próximo passo
Ter um imóvel irregular desvaloriza o seu patrimônio em cerca de 30% a 40% no mercado, além de impedir financiamentos em caso de venda futura. Regularizar não é apenas uma questão de burocracia, é sobre proteger o investimento de uma vida inteira e garantir a herança da sua família.
Nas próximas postagens desta série, vamos mergulhar fundo em cada uma dessas soluções (Usucapião, Adjudicação e muito mais) e descobrir quais as formas mais eficientes de regularizar seu patrimônio.
Espero que a leitura tenha sido proveitosa.
Vejo você na próxima postagem da série!
Ficou com alguma dúvida específica sobre a documentação da sua casa ou deseja uma análise da situação do seu imóvel? Deixe aqui nos comentários ou entre em contato conosco. Às vezes, uma simples análise da matrícula resolve anos de incerteza.
Nosso escritório é especializado em Direito Imobiliário e oferece atendimento completo para identificar pendências e indicar o melhor caminho para regularizar seu patrimônio.


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